O guia dos elétricos de Lisboa

Foi em 1901 que a primeira linha entrou em funcionamento, levando os lisboetas do Cais do Sodré a Algés. São mais de 100 anos de história deste meio de transporte que é um postal da cidade.

Mais de um século depois da sua entrada em ação na capital portuguesa, olhamos para os elétricos de Lisboa e pensamos o quanto à frente do seu tempo estavam: são um meio de transporte coletivo, não poluente e pleno de charme.

Hoje, na era dos veículos elétricos, os clássicos amarelos continuam a circular pela cidade, deslizando pela rede elétrica com a ajuda de uma roldana e transportando até 42 passageiros. Partamos à descoberta da cidade das sete colinas, em viagens cinematográficas que não se perderam com o tempo.

 

28, o afamado

elétrico 28

Numa viagem com duração prevista de 48 minutos, o elétrico 28 é um sobe e desce que cruza bairros históricos como a Graça, Alfama, Chiado e Campo de Ourique. Um percurso aventuresco pelo coração de Lisboa.

No lugar do número 28, este elétrico cuja rota se inicia na Praça do Martim Moniz e termina nos Prazeres junto ao cemitério mais emblemático de Lisboa, poderia muito bem chamar-se “desejo”, como no filme de Elia Kazan.

É este o elétrico mais procurado e, até, disputado por quem visita Lisboa, tanto porque cruza alguns dos bairros mais típicos da cidade, como pelas suas subidas e descidas em ruas sinuosas. Mas mesmo tratando-se de uma atração turística ímpar, o 28 continua a ser utilizado pelos locais nas deslocações do quotidiano.

A viagem começa na Praça do Martim Moniz, freguesia do Socorro, às portas da Baixa Pombalina (é comum as filas adensarem-se na espera do elétrico, pelo que uma boa alternativa é fazer o percurso ao contrário, começando nos Prazeres).

É ao subir os degraus metálicos deste elétrico de Lisboa que se entra noutro mundo. A figura do maquinista, os estofos em pele, os avisos relativos a ladrões (pickpockets) – muito frequentes nas décadas de 1960 e 1970 – e os detalhes em madeira envernizada tornam a experiência uma viagem no tempo. 

Seguindo a Rua da Palma em direção aos Anjos, pela mais longa avenida de Lisboa, a Almirante Reis, o 28 prepara-se para subir até uma das mais altas colinas da cidade, a Graça. De seguida, dá-se uma das partes mais divertidas do percurso: a descida muitas vezes aos solavancos por Alfama.

Como que enfurecido, o elétrico parece querer entrar pelas casas, quase lhes raspa as paredes e, por vezes, algumas crianças e aventureiros penduram-se na sua traseira apanhando boleias curtas.

A passagem pela Sé de Lisboa torna os olhares mais agudos e devolve o 28 a ruas largas. Entrando no Chiado, o elétrico passa pela Faculdade de Belas-Artes, circunda o Largo de Camões (junto ao Bairro Alto), deixa ouvir os pássaros de Santa Catarina e volta a descer por uma das ruas mais íngremes do centro histórico: a Calçada do Combro.

A descida conduzirá até São Bento, bairro onde se instala a Assembleia da República, para se voltar novamente a subir em direção à Estrela, com a sua basílica do lado esquerdo e um majestoso jardim à direita.

Resta passar por dentro Campo de Ourique até chegar à porta do Cemitério dos Prazeres, onde descansam altas figuras da história e cultura portuguesas, como o poeta Mário Cesariny, o pintor José Malhoa ou o escritor José Cardoso Pires. 

Embora o percurso completo do 28 ligue o Martim Moniz a Campo de Ourique (Prazeres), dada a grande afluência de turistas, também circulam elétricos de trajeto mais curto, que ligam o bairro da Graça à Estrela. 

 

12, o rápido

Realiza o percurso mais curto de todos os elétricos de Lisboa, fazendo um círculo que começa no Martim Moniz e que chega até ao Castelo.

São apenas 11 paragens e 21 minutos de viagem, mas o elétrico 12 tem o dom de nos fazer subir até à colina mais alta da cidade: o Castelo. É, por isso, um meio de transporte digno de nota. 

Saindo igualmente da Praça do Martim Moniz, o velhinho 12 passa por alguns pontos comuns ao 28, como o Largo das Portas do Sol ou o Miradouro de Santa Luzia, um dos miradouros mais impressionantes de Lisboa, aberto para o dominó de telhados da cidade e o espelho do rio Tejo.

Depois de chegar à porta do Castelo de São Jorge (Limoeiro), o elétrico desce pela Sé de Lisboa, toma a Rua dos Fanqueiros, na Baixa, e regressa ao ponto de partida. 

 

15, o ribeirinho

elétrico 15

Muitos dos elétricos número 15 são já modernos e articulados, mas de vez em quando um veículo antigo surpreende passando junto ao rio Tejo.  

É preciso ter sorte para apanhar um elétrico antigo nesta rota que liga a Praça da Figueira a Algés. A maior parte dos elétricos 15 é moderna (foi fabricada nos anos 90), privilegiando a eficácia da viagem em detrimento do charme histórico. Seja como for, o percurso do 15 sobre os carris vale muito a pena, porque é o único da cidade que proporciona uma experiência à beira-rio.

Começando na Praça da Figueira, antigamente um dos grandes centros de comércio de produtos hortícolas cultivados na periferia e onde ainda hoje se realizam com frequência pequenas feiras e mercados, o elétrico 15 começa por mostrar um dos ex-libris de Lisboa: a imponente Praça do Comércio, com as suas arcadas e um espaço imenso agitado pela circulação permanente de pessoas.

Em cinco minutos de reta, entramos no Cais do Sodré, que tanto historicamente como no presente, assumiu-se como um lugar de bares, noite e música.  Noutros tempos, marinheiros vinham afogar as suas mágoas, divertir-se e repousar nas pensões da zona. Hoje, funcionam casas de espetáculos e lazer como o Music Box ou a Pensão Amor.

A viagem continua pela frente ribeirinha, em direção a Alcântara, bairro onde se situa o Museu da Carris (empresa que gere a frota dos elétricos de Lisboa). Aqui é possível visitar a memória do transporte público de Lisboa, através de fotografias, uniformes, bilhetes de viagem, elétricos e autocarros antigos (a Carris existe desde 1872), desde o tempo em que a mobilidade era dependente da tração animal. Mas talvez o ponto mais alto do percurso seja a seguir.

A chegada a Belém, um dos lugares mais monumentais e simbólicos de Lisboa, pela sua ligação com os Descobrimentos, impulsiona muitos viajantes a abandonar o elétrico 15 por aqui. O Mosteiro dos Jerónimos e a Torre de Belém são monumentos incontornáveis ligados à história do país.

Numa perspetiva mais contemporânea, o Centro Cultural de Belém (que integra o Museu Coleção Berardo) e o MAAT – Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia fazem as honras às artes.  

Outro elétrico com uma parte do percurso junto ao Tejo é o 18. No entanto, devido às obras de requalificação do Palácio Nacional da Ajuda, a rota original (do Cais do Sodré à Ajuda) está interrompida desde março de 2019, obrigando a translados a meio do percurso.

 

24, o do Príncipe Real

Para muitos locais, o 24 percorre um trajeto utilitário, ligando o centro nevrálgico da cidade a uma zona mais empresarial. O 24 é o único elétrico de Lisboa, no entanto, a permitir uma viagem até aos doces ares do Príncipe Real.

Do Largo de Camões (o clássico ponto de encontro na cidade para quem vai passear no Chiado ou jantar na zona da Bica ou do Bairro Alto) até Campolide, o elétrico 24 conduz-nos numa viagem de 29 minutos.

É uma oportunidade para conhecer locais emblemáticos como o Miradouro de São Pedro de Alcântara, que se debruça sobre a cidade, ou o Príncipe Real, local de palacetes, bistrôs e lojas com as últimas tendências. 

Foi D. Pedro V, o tal príncipe real, quem deu o nome ao largo onde se situa um dos mais belos jardins da cidade – num dos seus extremos, um ondulado cipreste com mais de 140 anos dá as boas-vindas. No século XIX, o Príncipe Real foi lugar de mercados e feiras, fenómeno que ainda hoje acontece, aos sábados, com o mercado de produtos biológicos e uma feira de artesanato.

Nas imediações do jardim, erguem-se palacetes que animaram Lisboa com os seus salões, durante as festas da nobreza. São o caso dos números 21 a 23 (Palacete dos Anjos) e 26 (Palacete Ribeiro da Cunha).

Mas o elétrico continua, seguindo pela Rua da Escola Politécnica muitas vezes atravessada pelo escritor Eça de Queirós para ir à Confeitaria Cister, passando pelo Jardim Botânico de Lisboa e pelo Museu Nacional de História Natural e da Ciência.

Antes de chegar ao destino, Campolide, as janelas voltam-se para o edifício assinado por Tomás Taveira, o simbólico e controverso complexo das Amoreiras, que foi o primeiro grande e moderno centro comercial do país. 

 

25, o da Lapa

O bairro da Lapa, com os seus vislumbres de rio e os casarões onde funcionam embaixadas, não seria o mesmo sem a graça do elétrico 25. A viagem inicia-se na Praça da Figueira e termina em Campo de Ourique.

O 25 arranca na Baixa, perfura a Rua de São Paulo e o Conde Barão e mantém-se pouco distante do rio Tejo até Santos. É então que começa a subir para Santos-o-Velho, zona emblemática que esconde as ruelas da Madragoa e um dos museus mais bonitos e singulares do país, o Museu Nacional de Arte Antiga

De Santos-o-Velho até à Lapa, um bairro alto, luminoso e com glamour, é uma questão de minutos. Na Lapa, situam-se muitas embaixadas, com os seus magníficos jardins privados cujas copas altas nos deixam ter um aroma dos seus encantos.

É também aqui que se situa uma das casas de fado mais míticas de Lisboa, Sr. Vinho, que tem Aldina Duarte ou Gisela João no elenco, e pratos típicos da gastronomia portuguesa na ementa. 

Da Lapa, este elétrico de Lisboa segue para a Estrela, parando em frente à Basílica e seguindo viagem até Campo de Ourique, com passagem pela grandiosa Igreja de Santo Condestável e o final, mais uma vez, em frente ao Cemitério dos Prazeres

 

Os ascensores

ascensor da Bica

Têm um aspeto muito semelhante ao dos elétricos mas uma função bem diferente: ajudar a subir e a descer as encostas de uma cidade acidentada como Lisboa. Falamos dos ascensores da Glória, do Lavra e da Bica. 

A viagem num ascensor dura, em média, pouco mais do que três minutos. O ascensor de Lisboa com o percurso mais longo é o da Bica, que leva cinco minutos a subir desde a Rua de São Paulo até ao Calhariz.

Mas de quanto tempo – e de quanto esforço – precisaria para subir a famosa e fotogénica Rua da Bica de Duarte Belo a pé? A função original dos ascensores de Lisboa é mesmo essa: dar um pequeno empurrão quando o fôlego não chega. 

Além do Ascensor da Bica, Lisboa guarda duas outras experiências de subidas vertiginosas: a do Ascensor da Glória, que liga a zona dos Restauradores, no início da Avenida da Liberdade, ao Miradouro de São Pedro de Alcântara (junto ao Bairro Alto); e a do Ascensor do Lavra, num percurso entre o Largo da Anunciada, nas costas da Avenida da Liberdade, e a Rua Câmara Pestana.

Daqui, a experiência prossegue a pé com a descoberta de dois belos jardins: o Campo dos Mártires da Pátria (um lugar especial, com galinhas à solta) e o espantoso e quase escondido Jardim do Torel.

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